sexta-feira, 16 de outubro de 2015

Compreendendo Forças de Impacto

Esse artigo é uma adaptação de outra das palestras da Emiliy Splichal, recentemente adaptei outro artigo dela, falando sobre os tipos de calçado adequados a diferentes perfis e situações, aos que quiserem conferir: 


Para os que quiserem ler este artigo no original em inglês: Understanding Impact Forces.


Entendendo Forças de Impacto
Emiliy Splichal

Cada vez que o corpo entra em contato com outra estrutura, ele encontra forças de impacto. Estas forças podem ter uma influência na eficiência do movimento, risco de lesões, na marcha e na saúde dos membros. 
Nesse artigo vamos ver especificamente as forças de impacto que o corpo encontra através do pé, iremos aprender:

  • A magnitude de forças de impacto que o corpo encontra durante atividades comuns, como caminhada, corrida e saltos.

  • Como o corpo sente forças de impacto.

  • Como o corpo mantém as articulações e os tecidos moles seguros quando encontra grandes forças de impacto.

  • Os fatores que contribuem para as forças de impacto lesivas mais comuns, como fraturas de estresse e dores nas canelas (N.T: Síndrome de tensão tibial, síndrome de estresse tibial, etc. Conhecida popularmente por canelite).



Forças de impacto experenciadas durante atividades diárias

Cada vez que o pé atinge o solo, o corpo encontra forças de impacto. Quando caminhamos, estas forças de impacto ficam entre 1 - 1,5 vezes o peso corporal. Quando começamos a correr, isto aumenta para 3 - 4 vezes o peso corporal.




















Para atividades mais balísticas como saltos ou aterrissagens em alta velocidade, o corpo suporta forças de 10 ou mais vezes o peso corporal. Ginastas suportam mais de 18x o peso corporal em forças de impacto quando fazem alguns movimentos.

Como se pode ver, a magnitude de forças de impacto mesmo em atividades diárias comuns pode ser bastante grande. Não pense em administração de forças de impacto como algo somente para atletas de elite. Este é um importante tópico para a saúde e performance de qualquer um, independente da idade e nível de condicionamento.



O que acontece quando o corpo entra em contato com o solo

Quando seu pé entra em contato com o solo, ele encontra uma força de impacto. Na verdade, o corpo percebe essas forças de impacto como vibrações. Estas vibrações são captadas por milhares de terminações nervosas na pele. Cerca de 80% dos receptores na sola do pé são sensíveis à vibração.
Cerca de 80% dos nervos da sola do pé são sensíveis à vibração

Quando se trata de administrar e prevenir lesões que são causadas por forças de impacto, como fraturas de estresse ou síndrome de tensão tibial, a frequência destas vibrações torna-se um fator muito importante. 



Estas vibrações têm uma frequência entre 15-20 hertz, significando que elas entram no corpo em menos de 50 milisegundos. O corpo portanto, deve ser capaz de absorver estas forças adequadamente em 50 milisegundos.



Como exatamente o corpo absorve estas forças de impacto?

É uma crença comum que estas vibrações são absorvidas em articulações ou através de contrações excêntricas. Mas de acordo com a teoria de Sintonia Muscular introduzida pelo Dr. Brenno Nigg (N.T: Muscle Tuning Theory em inglês. Resumindo é uma teoria que diz que regulamos a resposta muscular às forças de impacto com o solo a cada passo, a fim de minimizar as vibrações que passam através dos tecidos dos membros inferiores. Aos que quiserem ler um pouco mais a respeito, confiram: Nigg, 2001 e Nigg e Wakeling, 2001), o corpo na realidade absorve e amortece vibrações através de contrações isométricas. Quando os músculos contraem isometricamente, a pressão intracompartimental da parte inferior da perna e do pé aumenta, o que amortece as vibrações. 


Todos músculos e tecidos moles vibram em uma certa frequência. Tecidos moles não gostam de vibrar, então os músculos contraem isometricamente para parar as vibrações. 


Então onde essa energia vai parar? Ela é armazenada dentro dos tecidos conectivos, especificamente nas fáscias e tendões, como energia potencial. Essa energia é então liberada como energia cinética no contramovimento (N.T: Na fase excêntrica dos movimentos há o armazenamento de energia potencial, embora haja discussões do local exato onde essa energia é armazenada e quais os locais de armazenamento de energia, para na fase concêntrica haver a liberação de energia, fazendo com que o movimento seja mais eficiente).





O que pode dar errado

Lesões através de forças de impacto podem ocorrer em qualquer combinação de alguns processos. Vamos ver cada caso.




A) As forças de impacto são percebidas incorretamente

A pesquisa do Dr. Benno Nigg descobriu que o corpo pode armazenar e lembrar de informações a respeito de forças de impacto que ele experencia após apenas 3 ou 4 passos. O corpo é capaz de lembrar as características da superfície e velocidade da caminhada e a magnitude das forças de impacto que ele experencia.



Esta informação ajuda a determinar a resposta correta para um movimento seguro e eficiente.


Uma vez que a informação vem dos nervos na pele, na sola do pé, os calçados podem ter um bastante influencia na habilidade de perceber com precisão as forças de impacto. Esta é a razão pela qual os calçados têm um impacto tão grande na maneira como caminhamos, corremos e nos movemos em geral.


Quando mais acolchoado é o calçado, mais grossa a sola ou mais rígido, mais ele irá alterar a percepção das forças de impacto. Tenha cuidado quando for selecionar um calçado ou recomendar um à seus clientes, já que ele pode ter um sério impacto na eficiência do movimento, risco de lesões e saúde do pé.

Calçados com sola rígida ou grossa alteram a informação recebida pelo pé a partir do solo


Já andar descalço, fornece ao corpo informações precisas a respeito do solo

A maioria das pessoas acredita que adicionar mais amortecimento ao tênis diminui a magnitude das forças de impacto com que o pé se depara. Enquanto que isto até pode soar correto, na verdade o oposto é verdadeiro. O amortecimento no tênis na realidade distorce a percepção dos receptores na sola do pé e como eles detectam vibrações, isso acaba levando a um impacto maior. Opte por menos amortecimento no calçado para minimizar o risco de lesão.



Superfícies inconsistentes também podem impedir o corpo de perceber com precisão a chegada de forças de impacto, fazendo com que fique difícil julgar qual resposta dar à essas forças.



Em um de seus livros, o Dr. Benno Nigg relata o tempo em que foi contatado pelo Cirque du Soleil em Los Angeles. Os artistas da trupe de repente começaram a sofrer com lesões como tendinite do aquiles e fasciite plantar. A companhia não conseguia descobrir o porque disso estar ocorrendo.



Por que artistas profissionais, altamente bem condicionados e habilidosos, de repente começaram a se lesionar fazendo movimentos que estavam habituados a realizar?



Dr. Nigg começou a investigar e finalmente encontrou o problema. 

As lesões começaram a acontecer após a companhia ter comprado um palco novo para seu centro de performance. Embaixo deste palco novo havia um monte de vigas.



Estas vigas mudaram a frequência de vibração da superfície acima, criando uma superfície inconsistente. Onde quer que houvesse uma viga, havia uma frequência de vibração diferente. Quando os artistas aterrissavam em uma parte do palco que estivesse sobre uma viga, eles experenciavam uma força de impacto com uma frequência diferente do que se eles aterrissassem em uma parte do palco que não estava acima de uma viga

As vigas de suporte faziam com que partes do palco ressonassem em diferentes frequências

Uma vez que as vigas estavam embaixo do palco, os artistas não tinham ideia se estavam aterrissando em uma parte do palco que tinha ou não vigas de sustentação. Eles então não tinham como perceber com precisão ou antecipar quais vibrações receberiam na aterrissagem.


E isto estava causando todas as lesões.

Dr. Nigg pediu que retirassem as vigas e se certificou de que todo palco tivesse a mesma frequência, para que onde quer que os artistas aterrissassem, eles fossem capazes de perceber e antecipar as vibrações que seus corpos receberiam.



Uma vez que isso foi feito, as novas lesões que os artistas estavam enfrentando cessaram.



B) A absorção de forças de impacto não ocorre rápido o suficiente

Uma vez que forças de impacto entram no corpo em menos de 50 milisegundos, as fibras de contração rápida são responsáveis por criar contrações de amortecimento. No entanto, as fibras de contração rápida as vezes levam até 70 milisegundos para alcançar o seu pico de contração máxima.



As forças de impacto precisam ser antecipadas

Isto significa que a reação somente dos músculos de contração rápida não é confiável, já que sua resposta simplesmente não é rápida o bastante. As forças de impacto precisam ser antecipadas.


Como mencionado anteriormente, o corpo automaticamente aprende a fazer isso quando encontra uma nova superfície ou realiza um movimento novo. O corpo é capaz de relembrar informações à respeito de novas superfícies e a magnitude de impacto das forças que experencia após apenas 3 ou 4 passos. Isso ajuda a criar a resposta antecipatória correta. 


De maneira prática, isso significa que se você está fazendo um movimento novo ou usando uma superfície nova, dê um tempo para o corpo captar as informações que ele necessita para criar a resposta antecipatória correta antes de fazer esses movimentos em uma nova superfície à uma velocidade mais alta ou com mais força.




C) Contrações não são fortes o suficiente para amortecer forças de impacto

Se os músculos não conseguem gerar tensão suficiente para criar a necessária pressão intracompartimental para amortecer as vibrações de forças de impacto, estas vibrações acabam sendo transmitidas através dos tecidos moles até o osso, causando todos os tipos de problemas. Assim é que, essencialmente, começamos a nos deparar com síndromes de tensão tibial e fraturas por estresse.


Isso também pode ser causado por fadiga. Quando nos tornamos fadigados, existe um acúmulo de ácido lático nos músculos. O que muda o pH do ambiente onde os músculos contraem. Quanto mais ácido está o ambiente, mais difícil se torna para o músculo contrair. Isso reduz o pico da pressão compartimental e a quantidade de amortecimento, tornando maior portanto, a probabilidade para as vibrações serem transmitidas aos tecidos moles e osso.


Desta forma é que a fadiga pode levar à lesões por sobrecarga excessiva (N.T: Overuse em inglês) e como isto é algo importante a se levar em consideração quando se trata de minimizar lesões relacionadas à forças de impacto. 




D) Não armazenar energia potencial apropriadamente

Quer estejamos caminhando, correndo, saltando ou dando cambalhotas, o corpo precisa armazenar energia das forças de impacto, antes que possa liberá-la sob forma de energia elástica no contramovimento. 



Por exemplo, durante a caminhada, 50% da energia que retorna quando o pé atinge o solo é armazenada e liberada pelo tendão calcâneo. A habilidade do tendão de armazenar e liberar energia potencial elástica é diretamente relacionada à sua habilidade de rapidamente enrijecer os músculos da parte inferior da perna e do pé.



Este recuo elástico é chamado de efeito catapulta e é a fundação da eficiência do movimento. Você pode reconhecer isto em atletas que podem se mover bem e parecem que têm uma "mola" nos pés.


Quando se trata da habilidade do corpo de armazenar energia potencial, precisamos prestar atenção à saúde do tecido conectivo. O tecido conectivo precisa ter o equilíbrio perfeito entre rigidez e elasticidade.



Quando envelhecemos, vamos perdendo as ondulações no tecido fascial (N.T: Formação das fibras de colágeno, em um padrão ondulado), o que causa uma redução na elasticidade. A fáscia então, pode começar a apresentar adesões.

À esquerda, um tecido fascial saudável com a orientação das fibras formando uma "tela ou grade". Além disso, aparecem as fibras de colágeno com sua formação ondulada. À direita, o tecido fascial que não é estimulado por tensão mecânica. A orientação das fibras desenvolvem um padrão irregular, além disso, as fibras de colágeno perdem sua formação ondulada. Dr. Robert Schleip - fascialnet.com

Problemas de saúde associados com a idade, incluindo diabetes e outras comorbidades também podem alterar a saúde de nossos tendões, fazendo com que percam a elasticidade e tornem-se mais rígidos (de uma maneira negativa).


Preste atenção à saúde do tecido conectivo. Nesse caso, a participação de uma nutrição apropriada, o uso de técnicas de autoliberação miofascial, exercícios de mobilidade e o treinamento usando saltos podem ajudar.





O impacto do tipo de superfície

Outro fator importante quando se pensa em reduzir lesões causadas por forças de impacto, é a superfície com a qual o pé entra em contato (N.T: Aos que quiserem conferir um artigo sobre o assunto, adaptado há algum tempo, aí vai: Demanda da Corrida em Diferentes Superfícies).

A maior parte de nós passa grande parte do tempo em contato com superfícies duras

Ao contrário de outras superfícies mais macias como a grama ou areia, superfícies artificiais como cimento ou mármore, não são boas em absorver forças. Quando o pé atinge uma superfície dura como cimento, as vibrações na realidade criam um efeito de rebote e voltam em dobro para o corpo.


Por isto que se mover em superfícies duras é tão pesado para o corpo. Elas criam mais estresse e fadiga nos tecidos conectivos e ossos, contribuindo para o surgimento de lesões.
Superfícies mais macias são mais fáceis para o corpo

Infelizmente, na sociedade de hoje em dia, as pessoas passam a maior parte do tempo caminhando em superfícies pavimentadas de prédios, calçadas e no asfalto. Combine isto com calçados rígidos e acolchoados e o resultado é um grande preço que nossos corpos têm de pagar.

Uma vez que queremos minimizar risco de lesões e cuidar dos tecidos conectivos e dos ossos, a superfície em que estamos nos movendo é um fator a se levar em consideração.
***


Aprenda mais maneiras de minimizar lesões causadas por forças de impacto na palestra completa de Emily Splichal

Este artigo foi adaptado da palestra chamada Entendendo Forças de Impacto (N.T: Understanding Impact Forces). Na palestra completa, você irá aprender as estratégias que ela usa para ajudar seus clientes a evitarem lesões causadas por forças de impacto, incluindo:


  • O que Emily recomenda para seus pacientes calçarem para melhorar suas habilidades de lidarem com forças de impacto, quando eles têm síndrome de tensão tibial ou quando correm em superfícies duras, como o concreto.

  • Como se ajustar à novas superfícies e quanto tempo você deveria dar ao corpo para se acostumar à superfícies não familiares.

  • Suplementos para manter a saúde dos tecidos conectivos (vitais para armazenar energia elástica durante o movimento).

  • Não pode mudar o calçado e nem a superfície de treino, mas ainda assim quer minimizar a chance de lesões causadas por impacto? Como alterar o movimento para diminuir essas forças.

  • Uma estratégia simples que ela usa com seus clientes antes de eles porem seus tênis, para melhorar a habilidade do pé de obter uma informação precisa do solo.
Para ouvir a palestra de Emiliy Splichal, aqui o link: Understanding Impact Forces.

Para mais sobre treinamento descalço, aqui o link: Evidence Based Fitness Academy

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