sábado, 10 de outubro de 2020

Aplicação da Teoria dos Sistemas Dinâmicos na Reabilitação

Artigo falando de um tema incrivelmente vasto, a Teoria dos Sistemas Dinâmicos ou Teoria dos Sistemas Complexos.

Esse tema vem crescendo muito em popularidade nos últimos anos, sendo discutido e adotado por muitos profissionais. Aos poucos irei introduzindo tópicos relacionados neste espaço, buscando esclarecer muitos pontos da teoria (das infindáveis e difíceis de entender teorias, melhor dizendo) e trazendo exemplos práticos sempre que possível.

Boa leitura.



Aplicação da Teoria dos Sistemas Dinâmicos na Reabilitação 

Domhnaill Fox




Nosso entendimento de maneira alguma é completo. Pode ser que nunca tenhamos uma compreensão completa da complexidade em jogo quando vemos atletas se moverem e desempenhar seu esporte.

Se reconhecemos isso, devemos respeitar a sabedoria inerente do corpo em resolver problemas e se adaptar à situações da maneira mais eficiente. 

O papel do treinamento passa a ser o de fornecer problemas para que o corpo os resolva, caminhando na direção que desejamos que vá o desempenho: Mais rápido, mais alto, mais forte. 

Essa é a premissa básica de como a teoria dos sistemas dinâmicos informa movimento e muitos profissionais que trabalham com desenvolvimento atlético começaram a abraçar esta abordagem no planejamento.

A reabilitação deveria seguir o mesmo caminho? Os dias da prescrição estrita da posição do pé, ângulo do joelho e de firmar o abdominal se foram?

Depende. Em certos casos, precisamos colocar carga em estruturas específicas: Tendão calcâneo, inserção do tendão do extensor comum dos dedos, etc.  

(N.T: Trabalhar em cima do tendão do extensor comum dos dedos é comum em casos de epicondilite lateral, chamada popularmente de cotovelo de tenista, imagem abaixo).

Mas quando reabilitamos um atleta para ser robusto e resiliente no esporte, então provavelmente devemos voltar o olhar na direção da natureza complexa do esporte e nos preparar de acordo.

(N.T: O termo "robusto", dentro deste contexto, na maior parte das vezes quer dizer "adaptável". Indivíduo que se adapta às mais diversas situações).


Tornando a auto-organização simples

O que isto parece? Meu argumento provavelmente é tendencioso, já que muitos de meus mentores são influenciados por Frans Bosch e Kelvin Giles.

"Quebra-cabeças de movimento" é um termo comum de se ouvir, vindo de pessoas que veem o treinamento ou a reabilitação através das lentes da complexidade. Nós montamos um quebra-cabeças para que os atletas resolvam, que seja relacionado com seu esporte e/ou problema do qual estejam se recuperando.

O quebra-cabeças estabelece restrições para o movimento e o atleta o resolve de uma maneira única (N.T: Da sua maneira). Não existem instruções reducionistas específicas.

(N.T: Um exemplo prático de exercício que estabelece restrições está no vídeo abaixo. Para chegar até a parede, o indivíduo é obrigado a passar a perna esquerda por sobre a barreira, e para passar sobre a barreira, ele é obrigado a fazer um hip lock, mais sobre o hip lock na sequência do texto)


Se o profissional quer um resultado diferente, ele precisa ajustar o quebra-cabeças (tarefa), as restrições ou o ambiente para permitir que o resultado emerja organicamente.

Esse não é um conceito novo, mas somente recentemente começou a ser adotado de modo mais amplo no mundo da reabilitação. Os fundamentos dos conceitos e princípios são mais complexos do que possamos entender, mas a aplicação é simples.

Buscamos formas do corpo se auto-organizar em direção a certos “Atratores” (componentes estáveis e econômicos do movimento). Estes atratores são, frequentemente, posições no movimento que os especialistas considerariam as mais apropriadas/eficientes/efetivas para completar a tarefa.

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N.T: O conceito de atrator é bem mais amplo e não caberia aqui por inteiro, alguns pontos no entanto:

  • O nome "Atrator" vem de atração, atrair (Do Latim "attrahere", puxar para si, atrair, arrastar). Sempre que ele estiver presente, o sistema será atraído para ele. 
  • É "Estável", no sentido de resistir à perturbações.
  • Por ser estável gera menor custo energético ao sistema.
  • Dentro do conceito de que estamos tratando: Movimento. Parece que os atratores que serão listados abaixo são "entidades" biomecânicas. Aqueles que seguem a linha de pensamento do psicólogo norte-americano James J. Gibson, a "Abordagem Ecológica", não acreditam que assim seja. 
  • Existe um "estado atrator", esse é uma unidade comportamental e não uma sequência puramente mecânica de movimentos.
  • Está ligado intimamente à percepção, o indivíduo percebe o que ocorre à sua volta e o comportamento atrator emerge espontaneamente, como resultado da percepção desse indivíduo daquilo que o cerca (pessoas, ambiente, etc.).
  • Nem sempre é bom, se o estado atrator for bom, deve ser reforçado. Se for ruim, deve ser modificado (o que nem sempre é fácil, mudar um comportamento ruim).

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O conceito exige que essas posições atratoras sejam estáveis e robustas sob altos níveis de stress e resistam às várias formas de perturbações.

Portanto, treinamos e estressamos os atratores em diferentes tarefas, restrições e ambientes.

Em seus livros, Stregth Training and Coordination e Anatomy of Agility, Frans Bosch descreve uma lista de atratores relacionados à agilidade. 


Listei-os abaixo, com uma breve descrição pra dar alguma perspectiva do conceito:

(N.T: Coloquei os atratores com seu nome original, entre parênteses uma tradução livre).

Hip lock (Quadril travado): Elevação da pelve da perna de balanço durante a saída dos dedos do solo (N.T: Toe off em inglês) – Uma força de fechamento do quadril.

(N.T: A imagem abaixo ilustra a elevação da pelve esquerda na fase de saída dos dedos do solo na corrida. Mais abaixo, um dos exercícios usados para treinar este atrator, uma variação do arranco usando uma anilha).



Swing leg retraction (Retração da perna de balanço): Extensão do quadril, joelho e tornozelo da perna de balanço antes do contato do pé com o solo.


(N.T: Pode ser um pouco confuso, já que a foto mostra o quadril em uma posição flexionada. Mas o movimento é o de extensão, já que a perna vem de cima para baixo).


Foot plant from above (Colocação do pé plano no solo): Combinação da colocação da planta do pé no solo com a subsequente força de reação do solo.

(N.T: A imagem abaixo mostra a combinação dos 2 últimos atratores mostrados no texto, "Retração da perna de balanço" com a "Colocação da planta do pé no solo". Mais abaixo, um exercício usado para treinar esse atrator).




Positive running position (Posição de corrida positiva): Posição vertical, quadris para frente, joelhos o mais para frente possível.

(N.T: Na imagem abaixo, no momento da saída dos dedos do solo, foram traçadas 2 linhas amarelas ao longo das 2 pernas. Foi traçada uma linha azul a partir do ponto de intersecção das 2 linhas amarelas. Em velocistas menos aptos, esta linha azul estará apontando mais para baixo).


Keeping the head still (Manter a cabeça parada): O mínimo possível de oscilação vertical.


Extending trunk while rotating (Extensão do tronco enquanto faz a rotação): Fazer isso permite-se à pelve e as pernas manterem a posição de corrida positiva.  

(N.T: Atrator fácil de visualizar em todos os arremessos).


(N.T: Todos estes atratores podem ser facilmente observados no vídeo abaixo, a partir dos 45 segundos).


Upper body first (Primeiro os membros superiores): Iniciação da mudança de direção pela cintura escapular – Aumento de tensão de cima para baixo.

Distributing pressure when decelerating (Distribuir pressão enquanto desacelera): Equilibrar a dissipação de forças através de múltiplas articulações simultaneamente – Tripla flexão. 


(N.T: O vídeo abaixo mostra como os atratores são universais, ao mostrar o mesmo comportamento ocorrendo em diferentes esportes. Frans Bosch, fonte do vídeo, levanta a ideia de que exercícios gerais também são específicos, só que são específicos para muitas coisas).


 

Como isso se encaixa na minha abordagem para reabilitação

Então, na prática, vamos olhar para o hip lock como um atrator para a corrida. Assim como em qualquer outra habilidade ou técnica, é inútil esperar que uma posição seja robusta sob stress se ela não é estável sob circunstâncias normais.

Portanto, temos de seguir o processo passo a passo no primeiro nível:

§  Aprenda a posição – Como produzi-la, como se parece, como se sente ao fazer.

§  A partir daí, consegue se mover livremente dentro e fora da posição?

§  Consegue fazer rapidamente?

§  Consegue sustentar sob resistência externa?

§  Consegue sustentar quando o equilíbrio é perturbado?

§  Consegue trocar rapidamente de um lado para o outro?

§  Consegue fazer enquanto alcança uma medicine ball acima da cabeça?

§  Consegue fazê-la enquanto se move para frente?

§  Consegue fazê-la enquanto roda a cabeça?

 

Então começamos a levar isso para o próximo nível:

§  Você vê a posição aparecendo na corrida?

§  Com a rotação da cabeça?

§  Enquanto carrega uma medicine ball?

§  Sobre terreno ondulado?

§  Sob fadiga?

§  Enquanto responde a um movimento do oponente?

Durante esse segundo nível, não existem dicas explícitas do treinador a respeito da posição corporal. O objetivo ao projetar um quebra-cabeças que envolva movimento é encontrar um desafio apropriado para o atleta.

O desafio apropriado é aquele onde exista alguma falha, mas não em demasia. Tenho ouvido sugestões que dizem que o desafio na medida ideal em um quebra-cabeças do tipo que estamos tratando, é aquele onde o indivíduo falha em cerca de 30% das vezes.

Baseado nisso, a progressão não será linear e achar um ponto de partida pode ser difícil.

 

Aplicando a teoria na prática

Então como a aplicação prática de tudo isso parece na reabilitação?

Digamos que tenhamos um corredor que tenha uma passada muito longa, em que o pé aterrissa muito à frente (N.T: Descrição do que em inglês se chama “overstride”. Imagem abaixo) e acabou desenvolvendo sobrecarga nos tendões distais dos isquiotibiais, como resultado da combinação de questões biomecânicas com alguns erros no treinamento.


Sim, iremos abordar a dor no tendão, com alguma sobrecarga ou talvez algum tipo de tratamento. Iremos educar o atleta a respeito de progressão do treinamento e sobrecarga. Mas a fim de abordar as posturas de corrida, não podemos simplesmente falar a respeito ou fazer algum exercício e esperar que se resolva. Precisamos provocar.

Nesse ponto é que as teorias apresentadas anteriormente entram em cena. Deveríamos procurar construir força muscular e estabilidade nos atratores da corrida positiva: Hip lock, co-contrações no tornozelo, joelho e quadril, ângulo positivo da tíbia, etc.

Uma vez que tenhamos checado esses itens, podemos construir quebra-cabeças de movimento a fim de obter melhores posturas de corrida.

Mudar a tarefa, as restrições e o ambiente é individual para cada pessoa. Não há um conjunto universal de parâmetros que permitirá o surgimento do movimento aprimorado. Mas podemos ter um ponto de partida com o qual nos sentimos confortáveis e, se observarmos cuidadosamente, podemos ver para qual direção nossas alterações direcionam o movimento emergente.

Aviso: Estes conceitos estão sendo aplicados aqui baseados no desenvolvimento atlético e nas teorias de coordenação. Não existem evidências científicas de nível 1 que sugerem o uso destes conceitos como intervenções. O artigo descreve minhas experiências e o que aprendi com a opinião de especialistas.

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Artigo original: Applying dynamic systems theory to rehabilitation

 



quarta-feira, 29 de abril de 2020

Feedback e Dicas Verbais - Parte 2

Continuação do artigo que fala sobre um tópico de fundamental importância e que ainda é pouco discutido: Como comunicarmos de maneira mais eficiente com as pessoas que treinamos. 

Aos que ainda não leram a parte 1: Feedback e Dicas Verbais - Fazendo com que Funcionem.

Aos que quiserem ler no original em inglês: Feedback and Cueing - Part 2 - Reliable Strategies.

No texto as palavras performance e desempenho são usadas de maneira intercambiável, já que performance é usada no português. Ou palavra que aparece muito no texto é "cueing" no sentido de dica, orientação. A palavra foi traduzida para "dica verbal", a forma mais comum de orientação que damos aos que treinamos. No texto muitas vezes irá aparecer simplesmente como "dica".  




Feedback e Dicas Verbais - Estratégias Confiáveis

Greg Dea




Movimento é uma saída de informações (N.T: Do original "output")um desempenho, um comportamento.
Quando treinamos alguém decidimos se o movimento é ou não satisfatório.

Lembre-se do último cliente que você treinou. Você parado por perto, observando. Se eu lhe parasse nesse momento no tempo e perguntasse: 
- Esse movimento é satisfatório? Sim ou Não?
Você poderia responder imediatamente? 
Ainda, poderia me dizer porque é ou não satisfatório? Caso não fosse, teria alguma ideia do que fazer a seguir?

Se o movimento é satisfatório colocamos sobrecarga para desenvolver capacidade de trabalho (N.T: Do original em inglês "Work Capacity". Adaptei um artigo sobre esse tema no Blog da FortiusO que é "Capacidade de Trabalho"?).

Se não é satisfatório precisamos avaliar para revelar o que (N.T: Qual parte, ou o todo) requer correção.

O profissional experiente usa o processo de treinar movimento para procurar por erros que extrapolem o aceitável.

Acontece de muitos de nós observarmos uma série sem prestar atenção ou olhar para a execução dos clientes, sem usar o processo mental de "Sim/Não", se é ou não aceitável aquele movimento e se necessita de nossa intervenção.

Este "domínio do aceitável" também é conhecido como "largura de banda de desempenho".

Para decidir se um movimento é aceitável, dentro da largura de banda, o profissional precisa ajustar o julgamento baseado em 3 elementos: A população específica, a tarefa específica e as amplitudes de movimento seguras (Richard A. Schmidt & Lee, 1999, 2014). Se qualquer um destes elementos revelar um movimento fora do aceitável sabemos que o erro irá:

  1. Reduzir a eficiência do movimento;
  2. Diminuir a chance de sucesso; ou
  3. Aumentar o risco de lesão.

Quando vemos estes movimentos fora da "largura de banda", podemos usar estratégias de treinamento de dicas verbais para mudar esse movimento. Nessa segunda parte do artigo irei revelar as principais formas de comunicação usadas para mudar o comportamento no movimento, ou seja, da performance. No primeiro artigo foram reveladas as diferentes formas de feedback (N.T: Retorno de informação). 

Antes de entrarmos no assunto, existe uma peça importante de feedback a ser buscada:


Isso dói?

Qualquer dor relacionada ao movimento precisa ser avaliada, uma vez que existem razões médicas para dor que se manifestam com o movimento e que podem não estarem relacionadas com problemas relacionados ao movimento em si.



Análises de movimento e avaliações, como o FMS e SFMA (N.T: Functional Movement Screen e Selective Functional Movement Assessment. Existem certamente outros modelos de análise e intervenção no movimento) usam estas 3 larguras de banda para ajudar a revelar qual movimento é ou não competente, ajudando, portanto, a diminuir nossos erros.


Dicas para Mudança, ao invés de Treinar para Mudança

Se você não consegue falar com seu cliente, como eu raramento podia fazê-lo na China, você ainda pode orientá-lo a se mover de maneira diferente. Fazer isto bem pode ser reproduzível de acordo com guias em pesquisas. Por "se mover de maneira diferente", quero dizer ser mais móvel, mais estável contra o movimento (estabilidade estática) ou mais estável com o movimento (estabilidade dinâmica) ou antes de se adicionar capacidade.

A restauração do controle motor e estabilidade ocorre através de:

  • Dicas baseadas na tarefa, e; 
  • Dicas com restrições que causam mudanças ao invés de dicas verbais que sugerem mudanças.

Dicas baseadas na tarefa e dicas com restrições são exemplos de movimentos com foco externo. Esses são mais efetivos e eficientes do que movimentos com foco interno (Marchant, 2010; Marchant, Greig, Bullough & Hitchen, 2011).

Uma dica externa geralmente tem benefícios embutidos, conhecidos como consequências implícitas. As dicas internas miram em mudanças de comportamento explícitas. Existem momentos para as duas, mas se os benefícios forem postos em uma balança, essa pende em favor de dicas externas com benefícios implícitos.




Dicas Implícitas x Explícitas

Uma dica que é direcionada para um resultado externo à pessoa, mas que tenha um resultado oculto dentro da pessoa é uma dica implícita

Estes tipos de dicas estimulam padrões de movimento e superam o problema de tentar superar muitas partes ou tentar controlar muitos graus de liberdade de movimento das partes. 

Estas dicas muitas vezes são chamadas de "focadas na tarefa", uma vez que a dica faz com que o indivíduo complete uma tarefa externa a ele. 

Um exemplo é alcançar um copo. Outro é arremessar uma medicine ball contra um ponto na parede. Incorporado em ambas as tarefas está a coordenação de múltiplas partes em um padrão, algo que não é abordado ao simplesmente ativar uma parte explicitamente. 

(N.T: A foto abaixo mostra uma dica verbal focada na tarefa, ao simplesmente pedir para que se arremesse a bola entre as 2 linhas na parede).



Uma dica que é direcionada a um resultado interno é uma dica explícita. Esses tipos de dicas estimulam movimentos ou controle de partes, isto é, músculos individuais. 

(N.T: Um exemplo são dicas verbais/instruções que damos às pessoas quando fazem um exercício como alguma variação de ponte, para "ativação dos extensores do quadril": - Firme os glúteos; estenda o quadril; firme o abdome...etc.).



Dicas implícitas são preferíveis, em comparação com dicas explícitas, exceto quando o objetivo específico seja hipertrofia muscular. As dicas implícitas aumenta a eficiência do movimento e o torque na articulação. 

Ao se orientar padrões usa-se dicas implícitas enquanto que ao se orientar partes se usam dicas explícitas. 

Existem momentos em que as dicas verbais para a performance direcionadas às partes desempenham um papel (N.T: Dicas verbais com foco interno ou como o autor vem chamando: "dicas explícitas"). 

 Por exemplo: Estimular a atividade neuronal na área do cérebro que é responsável pelo movimento de uma parte em particular. Esse é um processo adotado frequentemente na reabilitação neurológica. Também é usado no fisiculturismo, para direcionar a atividade local dos músculos.

Este é um treino que é focado no desempenho local das partes, comparado a um treino que é focado no desempenho de tarefas. Uma progressão que se distancia do treinamento focado nas partes para um que foca na tarefa produz maior eficiência e melhora o torque articular.   

Existem muitas evidências indicando que dicas explícitas ou o treinamento de partes isoladas levam à uma reorganização cortical do córtex motor. O treinamento isolado mostra uma alta atividade eletromiográfica (EMG) em comparação ao treinamento focado na tarefa que usa dicas externas. No entanto, uma alta atividade eletromiográfica não é o objetivo de um treinamento que visa performance.  

O treinamento focado na tarefa, que usa dicas externas mostra uma atividade eletromiográfica mais baixa, mas incorpora padrões mais eficientes que são específicos ao contexto (N.T: Contexto em que está inserido o (s) indivíduo (s) que está sendo treinado). Frequentemente com maiores torques do que contrações isoladas (Marchant, 2010). Também implica benefícios de overflow e irradiação - ver abaixo - conceitos que demonstram o torque aumentado em padrões de movimento gerais. É preferível o benefício de um torque aumentado do que uma atividade eletromiográfica (EMG) local (Adler SS, 2007).   


Benefício e Ciência de Dicas Auditivas

O papel da audição e como ela é usada na performance motora é uma área largamente pouco estudada, com algumas exceções. O objetivo da dica auditiva é ganhar a atenção (N.T: Dos indivíduos), quebrar padrões e melhorar a retenção do aprendizado. 

Em geral, a informação auditiva é processada mais rápido do que a visual, mas a informação visual parece ser mais útil do que a auditiva. 



Considere uma palma ou um grito antes de um comando. O objetivo de tal dica auditiva é simplesmente obter atenção para quebrar um padrão. Dicas auditivas primariamente permanecem úteis para quebrar padrões ao obter a atenção do(s) indivíduo(s).  

Aqui está porque:

  • Os melhores comportamentos de desempenho são movimentos de alta qualidade, com alta força, por um longo tempo.
  • A melhora da performance não acontece até que ocorram mudanças de comportamentos e do sistema nervoso que, afinal, permite a mudança de comportamento.
  • O processo de mudança do comportamento inicia com a obtenção de atenção do indivíduo - quer ele saiba ou não disso.
  • A obtenção da atenção consciente e inconsciente é domínio do treinamento ou programação do treinamento.
  • Cada um (consciente e subconsciente) tem seu papel. 
Obter a atenção dos indivíduos requer um sistema nervoso com receptores saudáveis para serem estimulados. Quando você fala com um atleta para passar uma instrução, isso requer uma audição saudável. Uma vez que a informação auditiva é processada mais rápido do que a visual, ela permanece uma ferramenta fundamental para quebrar padrões ao obter a atenção do sistema nervoso (Referência em Motor Control and Learning; A Behavioral Emphasis 5ª ed. Capítulos 5 e 11. Schmidt, R. A., Lee, T. D. 2011).




Benefício e Ciência de Dicas Visuais

Em movimentos que requerem rotação, flexão ou extensão, onde é requerida mobilidade extra, direcionar os olhos na direção do movimento irá estimular o padrão requerido. Ao contrário, onde mais estabilidade é requerida, direcionar os olhos para longe da direção do movimento irá estimular mais estabilidade. Isso é baseado na "reação de retificação". (Cech DJ, 2002; Hoogenboom, Voight, Cook e Gill, 2009; Piper MC, 1994).

(N.T: "Reação de retificação", do inglês "Righting Reaction" é uma reação que corrige a posição do corpo quando este é retirado de sua posição vertical normal. Essa reação sempre começa pela cabeça)

Também é baseado no conceito de overflow e irradiação.

Overflow ou irradiação pode ser definido simplesmente como a ajuda que é prestada para áreas chave ao fazer outra coisa.

Falando mais cientificamente, overflow ou irradiação é o aumento na facilitação que altera o limiar excitatório no corno anterior. Irradiação é a propagação e aumento da força como resposta. Isso ocorre quando o número de estímulos ou a força do estímulo são aumentados. A resposta pode ser de excitação ou inibição.
(N.T: Abaixo a anatomia do corno anterior da medula espinhal e a função de ser um local de eferência/efetua ações, enquanto que o corno posterior da medula é o local onde chegam as informações aferentes enviadas pelos proprioceptores espalhados pelo corpo).



Normalmente, overflow ocorre nos músculos que oferecem suporte sinergístico para os motores primários usados durante uma tarefa motora.


Dicas Visuais estão ligadas ao uso de flexão e extensão como vantagem

O reflexo óculo-vestibular assegura que quando a cabeça vira em direção a um alvo os olhos rapidamente irão se mover primeiro e então se movem em uma direção oposta à rotação da cabeça, para que continuem fixos no alvo até que a cabeça os alcance (Bizzi, Kalil e Tagliasco, 1971). Os olhos iniciam atividade com o braço e pescoço (overflow). Essa organização central do padrão do movimento nos fornece uma dica para estimular padrões de direção específica.

Foi comprovado que a mira/pontaria manual (incluindo alcançar e agarrar) é mais acurada quando a cabeça é livre para se movimentar do quando ela está fixa (Biguer, Prablanc e Jeannerod, 1984; Vercher, Magenes, Prablanc e Gauthier, 1994). Isso reforça a necessidade de eliminar a dor no pescoço e movimentos com padrões defeituosos do ombro. 



Dicas Práticas
  • Para melhorar o movimento em determinada direção, olhe nessa determinada direção.
  • Para melhorar a estabilidade contra o movimento em uma direção, olhe em outra direção.



O Benefício e a Ciência de Dicas Táteis

A compressão e a tração ao longo da cadeia cinética são ferramentas táteis para aumentar o controle motor. O objetivo é estimular o reflexo de estabilização. Tipicamente a resposta reflexa à compressão e a tração é o indivíduo expressar um padrão que pode ser descrito como extensão. Isso inclui abdução e rotação externa. 

Pode se dizer então que as dicas táteis são preferencialmente usadas para promover extensão, que leva ao reflexo de estabilização.

A quantidade de força requerida depende da riqueza do ambiente sensorial. 

 Por exemplo: Um indivíduo que tem mobilidade articular restrita pode não sentir a compressão sútil, uma vez que a articulação já está de alguma forma comprimida e os mecanorreceptores podem não detectar a força aplicada ou movimentos articulares acessórios. Essa pessoa pode responder melhor à tração da articulação. Uma pessoa com hipermobilidade pode responder melhor à compressão do que tração. 

A ação de compressão e tração ao longo ou sobre o eixo é conhecida no mundo do exercício físico como Reactive Neuromuscular Training - RNT (N.T: Uma tradução livre seria "Treinamento Neuromuscular Reativo"). É uma dica tátil que é coloquialmente conhecida por "exagerar o erro" ou "alimentar o erro". 

Essa é uma ação que pode ser usada para aumentar a estabilização das partes corporais que devem ser estabilizadas, mas que por alguma razão não estão. 

Em algumas circunstâncias os grupos musculares motores primários podem se tornar ativos para estabilizar segmentos. Isso reduz sua capacidade de expressar mobilidade. Nessas circunstâncias, estimular a estabilização através da compressão e tração pode facilitá-la nos músculos locais ao aliviar os músculos motores primários deste papel, para que continuem expressando a mobilidade daquele padrão que se quer realizar. 



Dicas Práticas:
  • Em um padrão que requer mais de um membro, observe o membro que não está se movendo (conhecido como o membro estabilizador) para a perda de extensão. Exemplo: Em um rolamento de supinado para pronado usando o braço como driver (N.T: Driver é o membro que inicia a ação, na foto abaixo o driver é a mão direita), frequentemente vemos uma flexão do quadril do mesmo lado, quando ele deveria estar estável.
  • Em um levantamento terra unilateral frequentemente vemos a perna de "balanço" com o quadril e joelho com alguma flexão, quando deveriam se manter em extensão. O instrutor/professor pode exagerar o erro ou "alimentar o erro" ao aplicar compressão ao longo do eixo (N.T: Da perna). Isso irá causar uma flexão ainda maior e o indivíduo de maneira reflexa irá resistir, empurrando a perna em extensão e estabilizando o quadril e tronco. Isto irá dar ao indivíduo uma sensação de como realizar o padrão na direção correta. A dica é empurrar a perna de estabilização em uma maior flexão do quadril, através da compressão do eixo. 
(N.T: Um exemplo prático do que foi dito acima é mostrado na imagem abaixo: Usando uma borracha para produzir uma força de compressão ao longo do eixo da perna de balanço no exercício levantamento terra unilateral).

O RNT (Reactive Neuromuscular Training) é uma dica tátil predominantemente usada para exagerar os erros do movimento através da linguagem da sensação, não palavras. 

Reactive Neuromuscular Training é uma dica cinestésica que aplica forças a uma distância da(s) articulação(ões) alvo, para exagerar o erro e estimular o reflexo de estabilização.

O RNT introduz mais risco de sair da largura de banda do movimento aceitável, estimulando, portanto, o indivíduo a corrigir seu movimento de volta à largura de banda do movimento aceitável (Cook, 2018; Cook e Voight, 1996; Guido e Stemm, 2007)

Dicas Práticas:
  • Por exemplo: Quando ocorre um colapso em valgo no quadril e pé, aplicar um stress em valgo no joelho irá exagerar o erro. A aplicação de força pode ser feita de maneira isométrica ou através de oscilações. Podem ou não serem incluídas dicas verbais para "não deixar que a força aplicada perturbe a posição estável dos membros inferiores". Isso é mais comumente aplicado em exercícios como o Turkish Get Up e em qualquer exercício em base meio-ajoelhada, mas pode ser aplicável em qualquer posição: Pronado, supinado, de lado, em pé em base simétrica, unilateral, base alternada. 

Dicas Práticas:

É importante que as dicas táteis (N.T: Ou cinestésicas) não façam o que se segue:
  • Não devem causar dor;
  • Não devem causar fadiga indesejada;
  • Não devem causar irradiação indesejada na direção errada ou em uma parte indesejada do corpo;
  • Se deve evitar que o indivíduo prenda a respiração;
  • Para aumentar a força muscular e a amplitude de movimento ativa, o indivíduo deve ser instruído a usar uma cadência respiratória controlada.


O Benefício de Dicas com Restrição da Tarefa

Esta estratégia é uma forma de dica com feedback que reduz a necessidade de ambos. Isto envolve aplicar uma restrição à tarefa de tal forma que se ocorrer o erro exista uma consequência. A consequência deveria ser significativa à natureza competitiva do indivíduo, para que o force a organizar o padrão para evitar o erro. Isso é chamado de auto-organização. 

A auto-organização ocorre quando a tarefa está "no limite da capacidade" dando ao indivíduo a oportunidade de administrar seu erro e aprendizado.



Dicas Práticas:

Um exemplo nos exercícios Chops e Lifts (N.T: Exercícios que usam as diagonais. Lift: Diagonal de baixo para cima; Chop: De cima para baixo) em base meio ajoelhada:

Coloque um cone com uma bola de tênis em cima ao lado do quadril que apoia o peso corporal, ou um rolo de espuma (N.T: Foam roller) em pé com uma bola em cima.

Se o indivíduo colapsa em uma adução ou flexão do quadril na perna de apoio, um cone ou rolo colocado ao lado do quadril será derrubado.

Em algumas circunstâncias, aplicar restrições à tarefa pode ser compensado pelo indivíduo, particularmente se elas não forem competitivas para aprender o melhor padrão. Nessas circunstâncias, completar o movimento com capacidade, mas ainda dentro da largura de banda aceitável da qualidade de movimento, tem precedência sobre o aprendizado. Para fazer isso ao invés de usar o RNT para alimentar o erro, nós simplesmente notamos o erro e criamos circunstâncias onde o erro não pode ocorrer. Vimos isso anteriormente no feedback fisicamente guiado. Existem outras formas, sem orientação física externa, para remover o erro quando o indivíduo não pode ou não irá aprender. Isso é chamado "bloquear o erro". Bloqueamos movimentos indesejados ao criar uma tarefa para prevenir movimentos desadaptativos. 

 Aqui está um exemplo: 



No treinamento do controle motor, onde existe movimento ao invés de estabilidade, o instrutor pode mudar a tarefa ou o ambiente para bloquear um movimento indesejado. No vídeo acima, esta jogadora de voleibol, pós reconstrução do ligamento cruzado anterior do joelho, está fazendo um arremesso de medicine ball acima da cabeça em base ajoelhada. É mais um padrão com sobrecarga para expressar a capacidade de potência do que uma tarefa de treinamento do controle motor

Nesse exercício, como ela gera potência é uma preocupação menor, uma vez que ela é meio de rede, ela irá bloquear com os braços acima da cabeça em uma posição estável e estabilização anterior do tronco, com extensão bilateral do quadril.



Quando a atleta está na posição ajoelhada (N.T: Como mostrado no vídeo acima), podemos ver alguma força extra sendo gerada ao se fazer uma flexão dos quadris, o que está de acordo com o propósito do exercício, que é um arremesso potente. 

Uma pequena mudança no exercício faz com que ele se torne um exercício de estabilidade estática para o quadril que sustenta boa parte do peso corporal (N.T: Quadril de apoio). A pequena mudança é fazer com que a base de apoio seja meio ajoelhada (N.T: O vídeo citado mostra o arremesso nas 2 bases: Ajoelhada e meio-ajoelhada). Essa mudança de posição da articulação do quadril em um lado faz com que seja muito mais difícil fazer a flexão dos quadris e a potência é gerada a partir dos membros superiores e o tronco, sobre uma pelve estável.

Não se trata de um exercício melhor ou pior, apenas um com propósito diferente de treinamento. Uma versão (N.T: Base ajoelhada) é um padrão de potência envolvendo a flexão do quadril, o outro (N.T: Base meio-ajoelhada) é um padrão de potência que requer estabilidade estática de maneira reflexa no quadril de apoio do peso corporal que está em extensão (e, claro, do pé de apoio do peso corporal que está à frente). 


Dica para melhorar os estabilizadores, para que os mobilizadores possam se expressar melhor


O exercício corretivo não é uma reprodução de um padrão faltoso. É em primeiro lugar uma correção da entrada de informações (N.T: Input) seguida da correção do padrão. A correção de entrada de informações inclui melhorar a mobilidade das partes dentro da cadeia cinética e, também, regionalmente nas partes complicadoras (N.T: Ou seja, nas regiões que apresentam problemas).

(Para ler mais a respeito de interdependência regional e fatores limitantes à performance acesse Aqui).


Dica Prática:

  • Para aumentar a mobilidade em uma determinada área, oriente a estabilidade em uma parte do corpo distante da parte móvel. Isso introduz uma dica que coloca estabilidade no sistema para que os mobilizadores globais possam ser melhor ativados. "Ative os estabilizadores para desatar os mobilizadores".


 Aqui está um exemplo: 

No vídeo da jogadora meio de rede, eu orientei a estabilidade na coluna lombar ao tirá-la de uma posição ajoelhada, onde ela fazia muita extensão lombar no arremesso, para coloca-lá em uma posição meio-ajoelhada. Isso fez com que fosse mais difícil estender a coluna lombar, portanto, estabilizando-a. A estabilidade aqui levou a mais atividade de arremesso da porção superior, isto é, dos motores primários do arremesso.



RESUMO

Analise seu atleta se movendo e decida se ele está dentro da largura de banda do comportamento motor que você possa tolerar. Pergunte como ele se sente quando se comporta de determinada maneira. Dê dicas para que se mova de maneira diferente (N.T: Caso o desempenho não seja adequado). Use estratégias de feedback cientificamente confiáveis e estratégias de dicas que façam com que se consigam melhores resultados.