segunda-feira, 18 de janeiro de 2021

"Slack" Muscular


Artigo que trata do conceito de Slack Muscular proposto pelo preparador físico holandês Frans Bosch, cujas ideias vêm ganhando popularidade no mundo da preparação física e reabilitação.

O termo original é "Muscle Slack". A palavra em inglês "Slack" tem o sentido de solto, relaxado, frouxo, folga, ela não foi traduzida quando aparece ligada ao conceito que é explicado no artigo, por vezes a expressão foi traduzida para melhor entendimento, ou seja, às vezes foi deixado em inglês e às vezes traduzida. 

Espero que dessa forma fique mais fácil de assimilar o conceito e ter familiaridade com a expressão em língua inglesa ou portuguesa. 

Artigo original: Muscle Slack




"Slack" Muscular
Max Schmarzo


Frans Bosch popularizou o conceito de slack muscular (Van Hooren tem publicações a respeito). Ele depende do estágio inicial da taxa de desenvolvimento de força e da velocidade em que o músculo, tendão e os elementos elásticos em série passam de "frouxos" para "tensos" (N.T: Frouxos no sentido de relaxados, soltos).


Quando um músculo não é ativado, ele está relaxado e existe uma "folga" no músculo, no tendão e nos elementos elásticos em série na medida em que eles estão pendurados de sua origem até sua inserção. Bosch usa a analogia de uma corda para auxiliar na descrição de como funciona o conceito de "Slack" Muscular.

Você está segurando uma extremidade de uma corda e a outra extremidade está atada a um carro, você é a origem e o carro é a inserção. Antes de puxar o carro a corda tem de estar tensa. Este é o ponto onde a corda passa de estar frouxa, arrastando no chão, a estar tensa, uma linha reta entre suas mãos e o carro.

Essa analogia é um sinônimo do processo das fibras musculares se alinhando da origem até a inserção. A segunda parte dessa folga é que agora a corda precisa tornar-se tensa o suficiente para que essa força possa ser aplicada ao carro. Nesse ponto a corda passa de estar em uma linha reta de suas mãos até o carro para retesada, com você produzindo força na corda. 

Isso é sinônimo da co-contração muscular produzindo força o suficiente no tendão para que o músculo se torne tenso. A captação da folga muscular (N.T: Muscle slack) ocorre durante o início (N.T: Do movimento) onde os elementos contráteis recebem o sinal químico para se alinharem, até o ponto onde a unidade musculotendínea e os elementos elásticos em série estão tensos.



(N.T: A palavra "affordances" neste contexto significa "oportunidade de movimento").


Por que o Slack muscular é importante?

Um músculo não pode produzir força até que a folga seja eliminada. A velocidade em que isso ocorre teoricamente pode variar entre atletas. O processo pode ser dependente de co-contrações e taxa em que a ação primária do músculo e os músculos sinergistas que estão co-contraindo possam desenvolver força.

Em outras palavras, o músculo tem de remover toda folga antes de desenvolver força. Quanto mais rápido se desenvolve tensão, melhor será a eliminação desta folga muscular (N.T: "Slack muscular") e vice versa.


Slack muscular no esporte

Movimentos esportivos não permitem ter suficiente tempo para que um atleta produza um movimento de pré-estiramento de grande amplitude (N.T: No sentido de um contramovimento, ou seja, um movimento excêntrico em direção contrária que potencializa o movimento desejado).

 Quando um velocista parte do bloco ele não tem tempo de fazer um grande contramovimento. No basquete, um jogador embaixo da cesta não tem tempo de fazer um grande contramovimento antes de saltar para bloquear um arremesso. Sem isso o corpo não tem muito tempo para desenvolver força durante essa fase de se abaixar (N.T: Lowering phase)

Ao invés, o músculo tem de achar outras maneiras de reduzir a folga rapidamente, o que significa que o desempenho destes tipos de movimento pode ser altamente dependente da taxa em que o atleta consegue tensionar o músculo. Uma vez que a folga seja eliminada, o atleta pode iniciar a força propulsiva.





Importância da amplitude

Como notado anteriormente, no esporte nem sempre se tem tempo para um grande contramovimento, o que nos leva a acreditar que treinar com grandes contramovimentos pode não ser específico.

(N.T: Um exemplo disso está na sequência de imagens abaixo, LeBron James não tem tempo para um grande contramovimento para saltar e dar um toco).


Bosch salienta que a utilização do "Ciclo Alongamento-Encurtamento" e da energia elástica pode na realidade não ser tão benéfico como se acreditava. Ao invés, ele declara que o início precoce da taxa de desenvolvimento de força e a superação da folga muscular (N.T: Muscle slack) pode ser de maior importância.

Assumindo que o Slack muscular e taxa de desenvolvimento de força precoces são aspectos fisiológicos chave no desenvolvimento esportivo é possível que o treinamento com grandes contramovimentos possa ser prejudicial.


Não somente não ocorrem no esporte, como as características neurológicas e fisiológicas inatas de um movimento de grande amplitude podem ser bem diferentes de um movimento de pequena amplitude.

(N.T: Quem sou eu para discordar, mas claramente existem ações de contramovimento no esporte, quando há tempo para que ocorram, como no voleibol, especialmente no vôlei de praia, um exemplo no vídeo abaixo, há um contramovimento da bloqueadora brasileira e, especialmente na ação de bloqueio, por vezes existe um enorme contramovimento por parte dos atletas).


Por exemplo, um movimento de grande amplitude irá aumentar o tempo total que tem um atleta para reduzir o slack muscular e, em essência, ensina o corpo a depender do contramovimento para o propósito de pré-tensionamento. Ao invés, treinar com uma amplitude menor pode ser mais benéfico para a redução do slack muscular, em virtude de que o tempo requerido para desempenhar um movimento é muito menor e possivelmente encoraje taxas de disparo neural mais rápidas.


Carga externa

Outro aspecto do slack muscular que Bosch aborda é a ideia de movimentos excêntricos com carga. No esporte, raramente o atleta irá encontrar um movimento excêntrico lento com carga externa (N.T: Uma exceção óbvia são os esportes que envolvem levantamento com pesos, como o powerlifting e o levantamento de peso olímpico)

Ao invés, o atleta irá encontrar um movimento excêntrico de maior velocidade, possivelmente com uma parte descendente passiva.

Por exemplo, um atleta de basquete se preparando para bloquear um arremesso não irá descer seu corpo lentamente antes de saltar. Ao invés disso, o jogador pode descer passivamente o corpo em uma pequena amplitude de movimento antes de explodir para cima (N.T: Mais ou menos como na sequência de imagens do LeBron James vista anteriormente).

Em razão dessas diferenças gritantes entre movimentos excêntricos encontrados no esporte e na sala de treinamento com pesos, é possível que colocar carga excêntrica em um exercício através de resistência externa pode não ser benéfico.

Pode ser que isso (N.T: Colocar carga externa) aumente a co-contração durante a fase excêntrica e no momento em que acontece a fase concêntrica o músculo já reduziu sua folga, o que ocorre de maneira diferente no esporte. Parecido com o que ocorre em grandes amplitudes, este tipo de resistência externa excêntrica pode prejudicar a capacidade do corpo de reduzir rapidamente a folga nos músculos. 

Reforçando, pode ser que ensinar o corpo a depender de uma carga externa para produzir co-contrações possa ter uma influência negativa no esporte.

























Treinado x Destreinado

Lidar com atletas destreinados é muito diferente. Bosch declara que o treinamento de resistência tradicional pode ser mais benéfico do que métodos de pré-tensionamento do músculo específicos, em virtude de que as adaptações fisiológicas positivas advindas do treinamento de resistência tradicional podem superar alguns aspectos negativos do slack muscular aumentado.

No entanto, à medida que o atleta se torna mais treinado e as mudanças fisiológicas causadas pelo treinamento tradicional não são mais tão pronunciadas, pode ser mais benéfico direcionar o treino para métodos que reduzam a folga muscular (N.T: Slack muscular). A razão para isso é que estes métodos podem ser mais específicos do que o tradicional treino de força, no sentido de auxiliarem mais com o pré-tensionamento requerido no esporte.


Reduzindo o Slack Muscular (co-contrações)

De acordo com os artigos de Bosch, a melhor maneira de reduzir essa folga muscular é através de co-contrações. Esse método requer uma carga mais leve, mínimo ou nenhum contramovimento e muito treino (aquisição de habilidades). 

Métodos específicos como superfícies instáveis, pequena amplitude e movimentos somente concêntricos podem servir como as melhores formas de aumentar a co-contração. No entanto, em virtude de ser um aspecto pouco estudado da preparação física é difícil de rotular métodos específicos como os mais efetivos.

A despeito da falta de clareza das sugestões acima, o que pode servir bem é evitar grandes amplitudes e cargas externas excêntricas.


Meus exercícios para reduzir o Slack Muscular






Aqui vão alguns links para publicações de Bosch e Van Hooren: 

  • Van Hooren, B., Bosch, F., Meijer, K. Can resistance training enhance the rapid force development in unloaded dynamic isoinertial multi-joint movements? A systematic review. Strength Cond J, 2017.


  • Van Hooren, B., Bosch, F. Influence of Muscle Slack on High-Intensity Sport Performance: A Review. Strength Cond J 38: 75–87, 2016.


  • Van Hooren, B., Zolotarjova, J. The Difference Between Countermovement and Squat Jump Performance: A Review of Underlying Mechanisms with Practical Applications. Strength Cond J, 2017.