quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Vetores Direcionais de Carga

Aqui vai um artigo do Bret Contreras que eu achei bem interessante. Ele fala sobre a questão de usar uma terminologia para descrever melhor e de maneira mais detalhada os movimentos que usamos na preparação física.
Creio que todos nós (educadores físicos e fisioterapeutas) poderíamos nos beneficiar no uso da descrição de movimentos que ele advoga, para alguns é só uma questão de nomenclatura sem maior importância, eu por outro lado vejo o que o Bret Contreras fala no artigo abaixo uma clara evolução na forma como descrevemos os movimentos.

Para não perder o hábito inseri alguns vídeos e algumas figuras a mais para facilitar o entendimento.
Leiam e tirem suas próprias conclusões.



Vetores Direcionais de Carga: Um novo paradigma para descrever o movimento.

Bret Contreras


Na profissão de treinador desportivo, é muito comum ouvir os treinadores utilizando a terminologia planar para descrever o movimento. Você pode ouvir um preparador físico dizer algo como: “Eu gosto desse exercício porque ele é multiplanar” ou “este é um ótimo exercício porque é um movimento no plano sagital que requer estabilização nos planos frontal e transverso”.



Estes são os 3 planos do corpo (são chamados às vezes de planos anatômicos ou planos cardinais) que são linhas imaginárias que dividem o corpo em 2 partes. Abaixo a descrição de cada um deles:

Plano Sagital
► Também conhecido como: lateral ou medial
► Divide o corpo em metades direita e esquerda

    Plano Frontal
► Também conhecido como: coronal
► Divide o corpo em parte anterior e posterior (parte da frente e parte de trás)

     Plano Transverso
► Também conhecido como: axial ou horizontal
► Divide o corpo em parte superior e inferior (parte de cima e parte de baixo)






Um chop ou lift feito no cabo seria considerado multiplanar uma vez que combinam movimentos nos planos sagital, frontal e transverso, e um agachamento é um movimento no plano sagital que requer estabilização nos planos frontal e transverso já que os joelhos tendem a cair para dentro em uma posição de valgo (adução e rotação interna do fêmur) que requer ativação apropriada do glúteo para prevenir esta perda de energia. Se você olhar as descrições dos planos acima será capaz de ver como um “polichinelo” é um movimento no plano frontal, uma rebatida do baseball é um movimento no plano transverso e um avanço (lunge) é um movimento no plano sagital.


Chop Sequencial no Cabo



Lift Sequencial no Cabo



Agachamento com joelho em valgo.



Polichinelo (plano frontal).



Rebatida do Baseball (plano transverso).



Avanço (plano sagital).



Embora a terminologia planar seja um bom começo, acredito que podemos fazer melhor. A terminologia planar é muito generalista, é por isso que precisamos de uma terminologia de vetores de carga. A terminologia de vetores de carga é mais específica ao movimento. Nossa profissão tomou emprestada a terminologia planar da linguagem anatômica, mas em geral a anatomia não olha para o movimento. A terminologia de vetores de carga é frequentemente usada na engenharia para descrever vetores de força. Como você deve saber, um vetor contém magnitude e direção.

Embora eu sinta que os preparadores físicos deveriam continuar a usar a terminologia planar dependendo da situação. Creio que estes preparadores físicos deveriam ser bem versados na terminologia de vetores uma vez que existem uma série de situações em que a terminologia de vetores é mais apropriada e descritiva.

Porque a terminologia planar é insuficiente? Na terminologia planar, saltar, correr e correr de costas são todos movimentos no plano sagital embora sejam bastante diferentes; já que em uma ação você está se movendo para cima, na outro está se movendo para frente e na última está se movendo para trás. A terminologia de vetores corrige estes tipos de deficiências e nos permite descrever melhor o movimento.

Nós podemos usar a terminologia de vetores como uma maneira de categorizar exercícios, descrever movimentos, avaliar os pontos fortes e fraquezas e escolher exercícios que podem ter uma melhor transferência para o esporte. Na sala de pesos, o uso de vetores leva em consideração a “linha de puxar” ou a direção da resistência, assim como a posição do corpo no espaço quando ele está se opondo diretamente a resistência ou “linha de tração”. A maneira mais fácil para determinar um vetor direcional de carga é usando imagens que mostram uma representação gráfica da direção da resistência (através de uma seta) em relação ao corpo humano na posição anatômica.



Terminologia Básica de Vetores de Carga:

Anterior – para frente (por vezes sinônimo de ventral).
Posterior – para trás (por vezes sinônimo de dorsal).
Lateral – para o lado (fora da linha média).
Medial – em direção ao centro ou linha média.
Superior – acima.
Inferior – abaixo.
Torção – rotação ou força rotacional.
Anteroposterior – da frente para trás.
Posteroanterior – de trás para frente.
Lateromedial – de fora para dentro.
Inferosuperior – de baixo para cima (raro).
Mediolateral – de dentro para fora.


Os 6 Vetores de Carga Primários no Treinamento de Força e nos Esportes:

Aqui estão os 6 vetores primários que eu vejo na sala de pesos:

1) Axial – pense em agachamentos, fazendeiro e desenvolvimento militar.

Agachamento


Fazendeiro


Desenvolvimento Militar




2) Anteroposterior – Pense em levantamentos do quadril (hip lift) e no supino.

Levantamento do Quadril (hip lift)


Supino



3) Lateromedial – Pense em slides e pranchas laterais.


Slide


Prancha lateral



4) Posteroanterior – Pense em puxar o sled de costas (backward sled), rollouts na rodinha e na remada unilateral.


Sled de costas


Rollout na rodinha


Remada unilateral



5) Rotacional (torsional) – Pense em chops e lifts, mina terrestre e press anti-rotacional (pallof press).

Chop
Lift
















Mina terrestre


Press anti-rotacional



6) Axial/Combinação Anteroposterior – Pense em lunge reverso, sled push e supino inclinado.


Lunge reverso


Sled push


Supino inclinado





Aplicação para o Treinamento da Especificidade Esportiva

Aqui estão algumas coisas a serem levadas em consideração:


• O Modelo de vetores direcionais é algo para se ter em mente durante a programação para certificar-se que estão sendo treinados os vetores corretos e manter a força equilibrada entre vários vetores.
Força muscular axial do quadril X força muscular anteroposterior do quadril;
força muscular axial do ombro X força muscular anteroposterior do ombro e
força muscular anteroposterior do ombro X força muscular posteroanterior do ombro deveriam ser balanceadas apropriadamente. Além disso, deveríamos adequar a estabilidade do core a partir de todas as direções.


• Deixe os vetores prevalentes vistos em ações esportivas influenciarem a seleção de exercícios e a concepção do programa de treinamento. Veja as figuras abaixo. O que elas lhe dizem?
Considere as linhas exatas de força propulsiva de cada atividade. Em seguida, faça uma análise que exercícios de potência e força muscular seguem aqueles mesmos vetores de força.



• Um atleta tipicamente se move em uma direção enquanto se estabiliza em todas as outras direções. Durante uma ação esportiva específica, todos os músculos e articulações do corpo se combinam para produzir força em determinada direção.


• Vetores direcionais são o melhor elogio à física e a anatomia funcional. Na física de Newton a terceira lei diz que para cada ação existe uma reação igual e oposta. As forças que você coloca no solo ditam a direção que você se move nos esportes.


• O treinamento de força muscular e potência em acordo com os vetores de carga apropriados ativam os músculos em uma sequência mais específica em relação a como eles são ativados durante o movimento esportivo.


• Não há dúvida que existe uma sobreposição entre o desenvolvimento de força muscular em vários vetores. Por exemplo: desempenhar agachamentos (vetor axial) com alta sobrecarga provavelmente transferirá para todos os outros vetores. No entanto, para força vetorial máxima, meios mais específicos são necessários. O corpo precisa estar adaptado para todas as linhas de força para níveis apropriados de força muscular. Muita ênfase em um vetor direcional sem ênfase suficiente em outro irá produzir resultados sub-ótimos e irá falhar em produzir o “Atleta Final” (N.T: aqui ele usa uma expressão americana comum: “Ultimate Athlete”. Que eu não sei bem como traduzir para nossa língua pátria. Quem souber manda um comentário). É perfeitamente possível ser forte em um vetor e fraco em outros. O desenvolvimento de força muscular geral através dos grandes exercícios básicos (agachamento, levantamento terra, supino, remada, desenvolvimento, etc..) certamente desenvolverão um atleta impressionante, mas o atleta pode estar mal preparado para atividades anteroposteriores, mediolaterais e rotacionais.
Por exemplo: Existe um atleta que é ótimo em agachar e saltar (ações axiais) mas péssimo em levantamento do quadril (N.T: ver figura no texto) e sprints (ações anteroposteriores), não vai bem no slide (N.T: ver figura no texto) e em exercícios de agilidade (ações lateromediais), e ainda não tem bom desempenho em chops e lifts (N.T: ver figuras no texto) que são ações rotacionais. Precisamos especializar o treinamento para obter resultados otimizados.


• Use todas ferramentas disponíveis para treinar os vários vetores: peso corporal, halteres, barras, kettlebells, borrachas, sleds, cordas (do tipo que se usa em cabos de guerra), correntes, colunas de cabo (ou um crossover), medicine balls, slides, sacos de areia, bolas suiças, coletes pesados, rodinhas (ab wheels), etc. Nenhuma única ferramenta pode treinar cada vetor.


• De acordo com a Lei de Wolff (N.T: Em 1870, Wolff estabeleceu a lei, hoje conhecida com seu nome, que, resumidamente, estabelecia que o osso responde aos esforços mecânicos com modificação de sua arquitetura interna) o osso se adapta para tornar-se mais forte de acordo com as linhas de força direcional colocadas sobre ele. De acordo com A Lei de Davis (N.T: seria a lei de Wolff aplicada à tecidos moles), os tecidos moles se adaptam tornando-se mais fortes de acordo com as linhas de força direcional colocadas sobre eles. Thomas Myers, um dos principais pesquisadores da fáscia, recentemente recomendou variação vetorial para a saúde fascial ideal (N.T: Para saber mais sobre Thomas Myers e a rede fascial, leiam o ótimo livro “Trilhos Anatômicos” e vejam o website: www.anatomytrains.com ).


• A coluna só pode suportar uma certa quantidade de carga em qualquer direção. Uma vez que temos forças compressivas cada vez que desempenhamos exercícios de força muscular com cargas axiais, cada vez que o psoas contrai, cada vez nós enrijecemos o core (N.T: o termo usado no inglês foi brace que é uma maneira de estabilizar o core, advogada pelo célebre pesquisador canadense Dr. Stuart McGill), não faz sentido ao menos variar os vetores direcionais de carga ao longo do treinamento, para dar à coluna alguma variedade?


• Muitas vezes o melhor programa para um indivíduo é aquele em que ele será compatível. Praticantes têm mais perseverança quando eles apreciam sua rotina. Em termos de preparação física os praticantes normalmente gostam de variedade. Variedade vetorial não somente fornece uma sessão de exercícios mais efetiva; ela fornece uma sessão mais divertida também.


• Se forem usados barras ou halteres, levantamentos feitos em pé normalmente tem como alvo vetores axiais, levantamentos na base supinada normalmente tem como alvo vetores anteroposteriores, e levantamentos na base pronada normalmente tem como alvo vetores posteroanteriores. Se usar cabos ou borrachas, levantamentos feitos em pé normalmente tem como alvo vetores anteroposteriores e posteroanteriores.


• Desempenhar variações unilaterais de extensões do quadril axiais tendem a aumentar o componente mediolateral, enquanto que desempenhar variações unilaterais de extensões do quadril anteroposteriores tendem a aumentar o componente rotacional.


• Para modificar o vetor de carga, seja criativo: mude a posição corporal, mude o ângulo ou linha de puxada, eleve uma parte do corpo, etc.



EXEMPLOS:

No começo do artigo eu discuti o que você comumente ouve na profissão em relação a terminologia planar. Agora eu darei alguns exemplos de como a terminologia vetorial pode ser usada em uma conversação. Talvez você diga à outro preparador físico:


“Enquanto que o agachamento é carregado axialmente, o kettlebel swing contém um vetor de carga mais anteroposterior e pode agir mais nos quadris em comparação ao agachamento”.

Kettlebell swing (N.T: não flexionem tanto o joelho, não achei um figura melhor)


“O agachamento unilateral com suporte é um movimento unilateral com carga axial que requer estabilização do quadril contra forças lateromediais e rotacionais”.

Agachamento unilateral com suporte


“Levantamentos do quadril unilaterais com os ombros elevados (N.T: fazer da mesma forma como mostra a figura só que com apenas um dos pés no chão) são movimentos carregados anteroposteriormente que podem ajudar a criar mais forças horizontais no sprint”.

Levantamento do Quadril (hip lift)



“O exercício press anti-rotacional (N.T: ou pallof press, ver figura no texto), é um exercício de estabilidade do core que contém componentes de estabilidade rotacional e mediolateral”.


“O levantamento terra unilateral com o peso colocado no membro contralateral (N.T: peso na mão oposta à perna que executa o movimento) é um movimento complexo porque o tronco tem cargas axiais e lateromediais quando se está em pé e cargas posteroanteriores e rotacionais quando dobrado. Então o tronco experencia vetores de carga axial, lateromedial, rotacional e posteroanterior enquanto o quadril da perna de suporte experencia vetores de carga axial, lateromedial e rotacional.

Levantamento terra unilateral



“O turkish get up muda os vetores de anteroposteriores e rotacionais para axiais e mediolaterais enquanto o movimento progride e então reverte no caminho de volta para baixo”.

Turkish get up


“Eu gosto de sled pushs (N.T: ver a figura em meio ao texto acima) porque ele imita a combinação de 45º dos vetores axial e anteroposterior vistos durante a aceleração da corrida”.


Como você pode ver, a lista poderia continuar. Esperamos os preparadores físicos comecem a incorporar a terminologia de carga vetorial em seu jargão e iniciem a conduzir uma análise mais detalhada no que diz respeito aos vetores nos esportes e na preparação física.

8 comentários:

  1. Marcus, no TF que aprendemos com o Alexandre (empurrar/puxar-vertical/horizontal, dominantes de joelho/quadril-bi/unilateral, todos os estabilizadores, quadril, cadeia posterior...)utilizando toda a variedade de implementos, nos levam a trabalhar em todos estes vetores apresentados no teu texto, certo? Aplicar o treinamento pensando em vetores parece muito mais complicado (não me pareceu assim tão simples...). Se eu montar o treino pensando em todos os movimentos que ele deve realizar, eu não chegaria no mesmo lugar do que pensando em vetores? O que vc acha? Abraço, Armando Jr.

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  2. Esqueci de uma coisa: parabéns pelo seu trabalho estar sendo reconhecido. Um dia também espero chegar a esse nível.
    Grande abraço!!!

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  3. Obrigado Armando, o reconhecimento vem aos poucos (no meu caso está bem no começo), penso que devemos fazer nosso trabalho sem pensar muito nisso, é algo natural que vem com o tempo e serve para nos dar a certeza de que estamos no caminho certo (e é um caminho beeem longo). Tenho certeza que o teu trabalho também está obtendo reconhecimento aí em Porto Alegre.

    Quanto ao texto vou citar as palavras de um gigante da indústria, Coach Boyle em uma discussão no forum do strengthcoach.com:
    "Penso que em 5 anos muito do que Bret diz no artigo será o padrão na nossa profissão. Me lembro quando a terminologia planar também causava confusão".
    Acho que é disso que se trata. Tudo que é novo (ou algo antigo visto sobre outra perspectiva causa confusão). De início parece complicado tanto que em outra resposta ele diz:
    "Não penso que isso muda muito o que outros já disseram quando falavam sobre planos de movimento, apenas é um jeito novo de olhar as coisas. Mas para ser honesto também estou lutando um pouco para entender as implicações disto".
    Também acho que não é tão simples assim de entender e aplicar. Me chamou a atenção a o ponto onde ele fala que deveríamos analisar as ações vetoriais nos principais gestos desportivos de nossos atletas e tentar enfatizá-las na sala de pesos para uma melhor transferência. Acho que isso talvez tenha um grande impacto no desenvolvimento de performance. Quanto aos nossos alunos comuns, talvéz não faça tanta diferença e a forma como planejamos o treino (procurando cobrir todos os pontos de forma balanceada já baste).
    Grande abraço.

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  4. Fala Marcus,
    que viagenzinha boa essa sua com os vetores!!! bom o texto cara!! sobre ele entendo seguinte: assim como um dia na faculdade tivemos aquela aula chata sobre planos e eixos também vale a pena nos submetermos a este novo olhar. imagina um dia pegarmos um artigo científico (ou vídeo, que seja) onde disserta-se somente através da linguagem de vetores...
    sem falar que me parece descrever melhor sobre alguns movimentos e principalmente os "MULTIPLANARES" hehehe
    um abraço!
    Costa Jr

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  5. Meu irmao.. Precisava falar com vc, sobre o curso de sabado agora com vc e o Xandao.
    Vamos ver se conseguimos nos falar no MSN.
    Forte abraço
    Michel Vilche

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  6. Este comentário foi removido pelo autor.

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  7. "O levantamento terra unilateral com o peso colocado no membro contralateral (N.T: peso na mão oposta à perna que executa o movimento) é um movimento complexo porque o tronco tem cargas axiais e lateromediais quando se está em pé e cargas anteroposteriores e rotacionais quando dobrado".

    Não entendi o seguinte: na segunda imagem do levantamento terra unilateral não se aplicaria um vetor de força posteroanterior sobre o corpo, em vez de um anteroposterior? Pois com flexão de quadril (projeção do tronco para frente) agiria sobre o tronco da pessoa a ação da gravidade e do halter para baixo?

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    1. Bem observado Felipe, concordo contigo. Alterado no texto já.

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